sábado, março 28, 2009

Pleonasmo Tautológico



Quem conta um conto, acrescenta um ponto. E como uma gaveta desarrumada, meias para um lado, cuecas para outro, nem sei do par deste enredo:

Molhada de tão seca, estava a alegria estendida ao vento como lençóis brancos no Verão.
Era espantoso ver como ele andava rápido sobre aquele piso pedregoso. Cabeça erguida, quase parecia que de destemido voava até ao intocável. Ela, atrás, tentava acompanhar o passo, no seu jeito mais desengonçado, ainda punha os braços abertos em busca do equilíbrio, mantendo os olhos atentos a qualquer pedrinha instável que estaria, estrategicamente colocada, para lhe pregar uma partida – morria de medo que num simples passo em falso, torcesse o tornozelo. Ao olhar para tal figura, pergunta em tom jocoso:
- A menina nunca se magoou?
Ela pára e, recuperando o fôlego e alguma estabilidade diz-lhe, ainda que meio insegura:
- Depende da perspectiva.

A ciência não a ensinou a andar, a sentir, nem a ver. Ensinou-a a questionar e tentar compreender a visão periférica que molda o imagem.



“São as tuas mãos...” - já me dizia eu, em sonhos com ele – “...Enquadra a tua perspectiva: O que queres ver? Até onde queres ir?...” – só de pensar que podíamos desvendar os mistérios do mundo sem conhecer qualquer equação matemática... fosse o pêndulo da balança a nossa vontade. Por isso, escolhe a moldura: Quadrada? Ou sem fronteiras?.. Escolhe a cor e eu dou-te o tacto.
Imaginasse eu a transparência do teu ser, tiraria fotografias de nós, que jamais seremos relembrados, por nunca termos existido.

E pronto... abro o livro e começo a ler, porque paranóia tem muito mais estilo em inglês.


"Oren Lavie is a songwriter of curly brown hair, whisperish voice, green eyes and suspiciously cold feet. He was born in 1976, two minutes behind schedule, and has been trying to catch up ever since."

segunda-feira, março 16, 2009

Morphine Me Out

Está quase... Está quase.
Está quase a chegar a hora em que vou sentar-me naquele parapeito,
virada para o mar,
pés descalços,
somente com o resto do mundo à minha frente...

Ai, estas temperaturas!...

quinta-feira, março 05, 2009

Toca Saxofone Para Mim Enquanto A Lua Se Distrai

Sempre o imaginei sozinho.
Sozinho, sentado com um ar de quem sabe muito e pouco mostra. Ar de quem absorve, despercebido, o mais ínfimo detalhe de alguém tão vulgar quanto eu. Como alguém que, quando estender a mão, no passo mais determinado das suas incógnitas, será para agarrar. (É de notar que, não é tanto ele que não sabe por onde anda, como eu que não sei para onde ele quer ir.)
Sempre o imaginei do género de se sentar numa pequena mesa redonda, com lugar só para si próprio, num bar epicureu perdido numa obscura rua. As escadas de pedra negra de tão suja, ladeadas por um corrimão já enferrujado, como se para um club secreto se descesse, dariam a conhecer um sítio que ninguém conhece. Quem conhece, não fala. E quem lá vai (o nosso legítimo segredo), esconde a que lá pertence. E por horas não se queira pertencer a nada mais, senão ao Jazz.
Lado a lado, no nosso já tão marcado caminho de improvisação. Eu, sempre fora de tom, e tu a chegares-te, nos teus movimentos de sensual felino, um pouco mais, mostrando-me que não é tanto a ciência e o raciocínio a darem as cartas, como as palavras que não queremos pronunciar. Essa sim, é nota assente neste ritmo de faminta tentação: a atracção fatal pelas dançantes curvaturas da linha de fumo do cigarro que, esquecido até, pinta o ambiente.
Ao franzer o sobrolho, penso que o copo não está cheio... nem vazio.
Minto.
Não vejo.
Nem sei se é da bebida ser branca ou das dioptrias aumentarem quanto mais insisto em não ver definido.
Por isso, confio mais nos meus outros sentidos.
Por isso, mudo de perfume todos os dias. Para não criar recordações.
Há um veneno que conheço o cheiro. Mas a minha natureza diz-me que sou alérgica ao pó. E, por isso, só queria deixar uma pegada quando o chão quase me devorou o pé.
Enforcada pelos suspiros - merda de coração rebelde e estúpidas vontades – sou Homem!, em todas as minhas cruzadas com Pessoas que me mostrem os delínios da forma ilustre. E vou-me sentindo sempre um bocadinho maior do que o meu corpo e mais pequena do que os meus sonhos.
Pergunto-me se não devia ter embarcado no bacalhoeiro que jurara erguer as velas não só para guiar o veleiro, como para servir de tela a filmes que se justaporiam a todo um céu.
Mas, não mais longe do que no meu quarto, a maçaneta da porta contorce-se e,
ao ver-te, digo:
- “Could you show me dear... something I’ve not seen... something infinitely interesting…?
Não digo.
Mas sorrio.
E penso:
Não é mérito meu. É culpa tua.
Elabora. Enamora-te.